Finalmente, um dos rostos mais aguardados pelos fãs das séries japonesas dos anos 80 pode ser conhecido pelo grande público.
Após anos de pesquisas, conversas com diversos dubladores e catalogações de inúmeros trabalhos, é com muita satisfação que realizo esse meu sonho pessoal, e suponho que muita gente compartilha deste mesmo desejo há tempos.
O primeiro trabalho que conheci do Ricardo Medrado foi na dobradinha Jaspion/ Changeman. Essas dublagens são datadas do final de 1986, mas só foram veiculadas em VHS no ano seguinte, até o grande estouro na TV Manchete, em 1988.
É fato que a maioria lembra dele como a voz do Tsurugi Hiryuu/ Change Dragon e do Macgaren, já que são as séries que mais cativaram os telespectadores quando nem se sabia da existência da palavra "Otaku" neste lado do mundo. E curiosamente foram esses dois personagens que ele "herdou" de outros profissionais, que fizeram a primeira parte das dublagens: Paulo Ivo (Changeman) e Francisco Borges (Jaspion). Inúmeros outros papéis apareceram em séries seguintes como Flashman, Jiraiya, Jiban, Metalder, e depois de um certo hiato, um fixo no Kamen Rider RX, em 1995. Mas em nenhum deles a sua interpretação marcou tanto como nos pioneiros.
Pelos depoimentos que colhi, Medrado era uma pessoa excêntrica. Curtia Rock (como é possível perceber na imagem, empunhando um disco dos Beatles), andava de moto e vestia-se de forma condizente com aquilo que curtia. Há alguém que lembra dele usando uma camisa estampada com a foto do Che Guevara, por exemplo. Gostava de tudo que fosse relacionado a som, e depois que afastou-se da dublagem, na segunda metade dos anos 90, abriu uma pequena fábrica de caixas de som e amplificadores. E com ela ficou até o seu falecimento, onde não se sabe o dia e mês exatos, mas foi em 2002. Não consegui encontrar a Mônica, sua ex-esposa, e tampouco tenho informações se deixou ou não descendentes.
Era muito querido e respeitava demais o Coordenador Artístico da Álamo na época, Líbero Miguel. Percebe-se que era frequentemente escalado nas dublagens desta casa em específico, mesmo após o falecimento do Líbero. Tudo indica que havia um bom relacionamento entre a casa e ele, e consequentemente com os diretores e dubladores da época. Fora dali, só tenho lembranças de um capítulo de Pica Pau, feito na BKS, onde um vilão teve a sua voz.
Amigos que trabalharam com ele disseram que era uma boa pessoa, mas tinha um temperamento enérgico. As vezes, sua personalidade oscilava entre o calmo e o agitado. Através dos registros de vozes que temos disponíveis, é perceptível a qualidade de sua interpretação, aliado ao timbre ímpar, impressa nos personagens que tiveram sua voz. Quem não se recorda das atitudes heróicas do líder do Esquadrão Relâmpago? E das maldades premeditadas do filho de Satan Goss?
Ricardo Medrado foi esse dublador. Marcou a infância - e consequentemente a vida - de quem foi criança nos anos 80, mostrando o poder e a responsabilidade de encarnar um herói, e ao mesmo tempo o outro lado, a personificação do demônio. E não é justamente isso que é preciso para ser um bom ator? Saber "passear" pelas nuances da interpretação?
Fica então eternizado a minha singela homenagem a este grande profissional da dublagem paulista, e o meu muito obrigado pelo trabalho que ele desempenhou durante sua carreira. Inúmeros momentos de alegria e diversão me foram proporcionados pelos seus personagens. Onde quer que esteja, desejo que esteja bem, Ricardo.
Ouça a voz de Ricardo Medrado clicando abaixo: